O campeão improvável quarta-feira, 19 outubro 2016 08:07

O campeão improvável

Pedro Barbosa, juíz internacional, faz a análise do Quiksilver Pro France, 9ª etapa do World Tour, em que o surpreendente Keanu Asing conquistou o troféu de vencedor, "despachando" pelo caminho John John Florence e Gabriel Medina, os dois primeiros classificados na corrida ao título mundial.

Ainda me recordo da frase de um amigo que, depois de passar o verão nos beach breaks franceses, nos anos 90 e no meio dos profissionais e dos eventos, me dizia: ” um top 44 é sempre um top 44”. Isto parece uma verdade de La Palice, tudo isto porque na altura tinha ficado impressionado com o nível apresentado por alguns dos surfistas que não estavam no topo do ranking e eram menos mediáticos, no entanto esta observação aparentemente simples fazia todo o sentido nos anos 90 e continua a fazer actualmente. E a prova disso é que o surfista em que ninguém apostaria para vencer este evento venceu.

 

Facto também interessante é que nos anos 90 existia um género de peregrinação a França de surfistas portugueses. Com os surfistas cada vez mais a viajarem para destinos exóticos e com melhores ondas, França parece que deixou de fazer parte dos destinos mais procurados. No entanto o verão francês, em termos de ondas, é de facto fora de série e como complemente à evolução de qualquer surfista europeu é fundamental. Bancos de areia incríveis e água quente que possibilita estar horas e horas dentro de água e a presença da nata do surf europeu nos principais picos e a uma curta distância.

 

Este ano o evento teve muito pouca história e foi muito pouco emocionante. Os melhores beach breaks do mundo mais uma vez estiveram longe do esperado e ao longo de todo o período de espera foram raros os heats que se realizaram em condições razoáveis. Os eventos interessantes no tour escasseiam e à excepção do que se realizou nas ilhas paradisíacas, Jbay e Trestles, os restantes têm ficado sempre aquém das expectativas.

 

Melhor performance:

Keanu Asing foi nas finais da prova o surfista mais consistente. Com o seu surf seguro e eficaz acabou por vencer o seu primeiro evento na WSL. Nunca tinha ganho nenhuma prova nem mesmo um WQS. Seguiu a receita do seu grande treinador, John Shimooka, que embora muito mais talentoso nunca conseguiu vencer um evento na era moderna da ASP. A receita transmitida pelo Shimooka era simples: “ Keep it simple. Agarra-te ao teu backside e faz surf top to bottom”. E com esta receita no último dia eliminou o nº1 e nº 2 do ranking e sagrou-se campeão do evento com todo o mérito.

 

Surfista com factor X:

Eu diria que, nesta prova, se houve um surfista que surpreendeu foi claramente o Filipe Toledo. Destacou-se de todos, apesar de não ganhar o evento. Fez manobras surpreendentes e o seu 10 foi do melhor e mais entusiasmante que se pôde ver em competição. A velocidade e projecção que consegue nesta manobra estão ao alcance de poucos no tour.

 

FILIPE TOLEDO 10 POINT RIDE AT QUIKSILVER PRO FRANCE 2016 from Surftotal TV on Vimeo.

 

Surfista em ascensão:

Com o 3º lugar alcançado Kolohe Andino é o surfista que mais posições sobe no TOP 10, no entanto espera-se mais do seu surf e com um 5º lugar no ranking o surf que pratica não corresponde ao de um top 5 mundial.

 

As ondas e as decisões dos calls:

Não creio que esteja a ser um ano fácil para o Kiern Perrow, apesar das muitas variáveis que existem na previsão e nas decisões a tomar, as fases finais das provas têm sido realizadas em condições muito pouco simpáticas e com igualdade de oportunidades em termos desportivos. Nesta prova o campeonato iniciou-se para terminar 2 heats depois, na final, as condições estavam fracas, creio que são factos reveladores do que se passou em Hossegor.  Quando a decisão de títulos mundiais está em jogo deve-se procurar condições que permitam igualdade de oportunidades nos 35 minutos da final.

O Julgamento e os casos da prova:

No inicio do evento existiram umas notas que me parecerem baixas em alguns heats, eventualmente estiveram sempre à espera de mais que acabou por não acontecer. Em temos de resultados acho que acabaram por ser justos. Por vezes existem surfistas cujo nível técnico não está no mesmo patamar e em termos de notas essa diferença nem sempre é considerada, Quando falamos dos melhores do mundo isso pode fazer a diferença.

 

Em jeito de resumo foi uma prova com muito pouca emoção onde nem os melhores surfistas tiverem possibilidade de mostrar as suas capacidades. As ondas mais excitantes foram o tubo do Conner Coffin (antes do evento começar) e o 10 do Toledo no 4º round. John John Florence  apesar de ser o líder do ranking e o melhor surfista de ondas a sério, o surf que pratica em condições fracas deixa muito a desejar, o estilo causal e de braços descaidos não conseguem disfarçar a falta de linha que tem quando o comparamos com anteriores campeões do mundo (Fanning, Slater e até mesmo Medina)

 

 As previsões para Portugal parecem boas. Esperemos que a prova seja um sucesso e que volte a colocar Peniche e o País onde merecem estar. Contamos com dois excelentes representantes, o Frederico Morais e o estreante Miguel Blanco. Esperamos que a sorte esteja do seu lado (que competência não lhes falta) e que consigam trazer um bom resultado para Portugal.

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