Pedro Barbosa: juiz internacional analisa o Fiji Pro quarta-feira, 01 julho 2015 15:31

Pedro Barbosa: juiz internacional analisa o Fiji Pro

Pedro Barbosa, juiz internacional de surf, faz a análise exaustiva do Fiji Pro.

 

A Surftotal e o Juiz Internacional de Surf, Pedro Barbosa, vão começar uma rubrica importante e de certa forma pioneira. As análises técnicas aos eventos de Surf, nomeadamente da WSL(WCT). Já há algum tempo que estes carecem de uma análise/avaliação/explicação mais técnica e rigorosa, por parte de quem tem qualificações. Anexo a esta rubrica a Surftotal nomeia os surfistas Portugueses que têm vindo a ter mais consistência no circuito WQS e o leitor terá a oportunidade de votar qual deles se adaptaria melhor, na sua opinião, à respetiva etapa WCT.

 

Fica aqui a primeira das avaliações do Juiz Pedro Barbosa.

Início da prova em Cloudbreak, um dos eventos mais esperados do ano, onde vimos, em anos anteriores, algumas das prestações mais memoráveis do antigo World Championship Tour (WCT). Espectadores sedentos de provas com ondas de excelência e que os façam vibrar, os melhores surfistas nas melhores ondas é o lema deste circuito. As condições no início da prova apresentavam-se com ondas com potencial mas também algumas bastante torcidas com pouca qualidade, os scores teimam em aparecer. Nos primeiros heats do evento tenho sempre bastante curiosidade para ver como é que os diferentes surfistas se vão adaptar a estas condições. A prova inicia-se com os suspeitos do costume nos primeiros heats do dia: Slater, Taj e os novatos Kolohe a Matt Banning, nada de relevante, notas médias e poucas oportunidades; ainda estavam a aquecer os motores.

O primeiro surfista que me fez usar a normal expressão ”Eh lá, temos aqui algo diferente”, foi o Wiggolly Dantas. Base sólida, surf bem no rail, bottoms largos,  speed, power e flow. Alguns dos parâmetros do critério de julgamento. É claramente um surfista que tem harmonia, bom nos tubos devido às largas temporadas que passa no Havai, manobras limpas com técnica refinada e capacidade de atacar as secções críticas com bastante controlo. O Ross Williams começa por fazer o 1º prognóstico: “don’t expect less than quarter finals for Wiggolly”. E não é que acertou…realmente a capacidade de análise deste grande surfista da geração Momentum é também algo de extraordinário, é um prazer ouvir as suas análises e comentários!


Wiggolly Dantas: foto WSL

Ainda na 1ª ronda, Gabriel Medina arranca numa onda média sem os tubos de heats anteriores, bottom largo, off the lip a chutar o tail, dois carves bem no rail e finalmente um 'reentry' fortíssimo. Impressionante, 9.23 melhor onda do round “Champion is back”. Este miúdo é fora de série. Não fez muito mais do que isto e parece estar a sofrer da síndrome pós Campeão do Mundo. Esperemos que retome o seu drive com urgência, o circuito necessita dele.


Na 2ª e 3ª rondas começou o espectáculo do filho pródigo, sim porque Tavarua é como uma segunda casa para o Slater, pode-se dar ao pequeno luxo de se deslocar na sua mota de água. Ainda me recordo de uma edição especial da Surfer com uma reportagem do Slater em Tavarua, colocação perfeita, estilo e sintonia com a onda como não havia igual. À medida que o evento evoluía em Cloudbreak a minha impressão foi de que o Kelly Slater iria ser o potencial vencedor da prova, no entanto, e como é normal, os vencedores de cada evento têm sempre um grau de imprevisibilidade bastante elevado.


Estatisticamente foi o melhor surfista destas 2 rondas, com scores altíssimos. No entanto a consistência faltou e o Slater teve dois heats bem abaixo do seu potencial, que a este nível não pode acontecer. Foi interessante ver a sua energia e competitividade quando perdeu na 4 ronda com o Julian, a vontade de ganhar e de se bater com os melhores continua toda lá, a chama continua acesa…




Nas fases mais adiantadas da prova o show foi essencialmente de três surfistas da mesma geração, e como dizia o Julian Wilson no caminho para a final, “it will be like in the pro-junior days”.



Melhor performance:

Claramente o Owen Wright, a partir da 5 ronda, dominou completamente o evento. O “triatleta”, que depois de uma grave lesão que o afastou praticamente 1 ano, voltou com toda a força. Sentíamos a sua falta, é claramente um atleta de excepção que o circuito necessita. A sua estrutura física de “Gladiator” e como diziam os comentadores a sua postura “zero fear”, fizeram com que fosse sem sombra de dúvida o surfista do evento. Não esquecer que o Owen, no seu 2º ano no circuito mundial e com apenas 21 anos, disputou até ao final o titulo como o Kelly Slater e é até hoje o surfista que ganhou o maior prize Money numa prova do WCT (300K$, CT de New York).


Alguns factos desta prova, onde o Owen foi indiscutivelmente o melhor surfista:

1. O Owen fez história pois é o primeiro surfista a ter 2 heats perfeitos num evento
2. Juntou-se ao restrito grupo dos 6 surfistas com heats perfeitos (2 notas de 10 pontos)
3. Fez a onda com maior variedade de manobras do evento (manobras de rail, tubo e um pequeno aéreo)
4. Dropar ondas de três metros e meio na espuma (a arrancar literalmente na espuma), chegar tranquilamente à base, fazer grandes bottoms e encaixar naquelas secções super intensas dizem muito acerca do nível apresentado nesta prova
5. O surf de frontside apresentado subiu um patamar nesta prova, a ligação e qualidade das manobras nas secções críticas e a intensidade dos tubos foi excepcional as palavras do Owen disseram tudo “I love the turns as much as I love the barrels”




O surfista com factor X:

Neste caso não poderíamos deixar de mencionar a excelente prova realizada pelo Julian, que dos três atletas que tiveram em destaque, me parece o mais completo e com o tal factor X que tanto gostamos. É muitas das vezes o surfista preferido de grande parte dos cibernauta, “o media darling” e um surfista de excepção que quando melhorar a consistência pode chegar a um titulo mundial. Fez uma aproximação aos lugares cimeiros do ranking, vamos acompanhar de perto nas próximas provas.


O surfista em ascenção:

Jeremy, foi um prazer ver o nosso representante europeu, apresenta-se num excelente momento de forma subiu 6 posições no ranking, foi o surfista que mais dificuldades criou ao Owen,  foi mesmo por muito pouco. Em termos de surf o Jeremy esteve fora de série também, um mestre nos tubos bem como nas manobras, colocação perfeita nos tubos, bottoms largos e excelente manobras no topo da onda com velocidade, rail e fluidez, o power terá de ser ligeiramente trabalhado. Alguns dados que provam a versatilidade e consistência do seu surf:

1. Foi o único surfista a ter ondas acima de 9 pontos apenas com manobras (9.27) e tubos (vários 9’s sendo o mais alto 9.93), isto por si só revela muito sobre a qualidade do surf apresentado
2. Foi o surfista que mais dificuldade criou ao vencedor, o Jeremy se não tivesse caído na última manobra de umas das suas 2 melhores ondas estaria na final com o Julian
3. Em todas as rondas, excepto no heat atípico onde o Bede cometeu um erro infantil, fez scores na casa dos 17 pontos, nalguns heats acima dos 18 pontos

Como não temos o nosso “Portuguese Tiger”, temos esperança que o Jeremy deixe de ser o líder inquestionável do Qualifying Series e ataque o titulo mundial, é isso que esperamos dele e para o qual ele trabalhou uma vida inteira.




As ondas e as decisões dos calls:

Finalmente tivemos umas ondas a sério, de 1 a 5 daria um 4, apesar de não ter estado como em anos anteriores, a direção do swell em algumas fases não foi a melhor, e em termos de consistência foi bastante variável com heats muito bons e outros mais fracos em termos de qualidade de ondas. Os surfistas demonstraram estar um pouco indecisos quanto à estratégia a adoptar, se iriam para manobras ou tubos. O Kieren Perrow, dentro do possível fez uma boa gestão dos calls.


O julgamento e os casos da prova:

Considero que o julgamento nesta prova foi muito bom, escala de 1 a 5, daria um 4/5. Gosto de salvaguardar que avaliar através da Net não tem a mesma intensidade e impacto que no local da prova contudo de uma forma geral, achei que estiveram muito bem em adaptar a escala ao surf apresentado e às condições do mar, existiram ondas de 9 pontos apenas com manobras em alturas onde os tubos não eram muito intensos e a diferenciação entre os tubos de uma forma geral também correu bem. Os cinco 10’s atribuídos, apesar de diferentes em termos de intensidade eram perfeitamente justificáveis e explicam porque é que os 2 9’s do Slater não poderiam se 10’s, ao contrário do que diziam muitos dos cibernautas.


Casos da prova:

Interferência do Bede ao Jeremy na ronda 3 – Não existe qualquer dúvida relativamente à decisão, no entanto foi um caso interessante e de certa forma deve ser uma área de reflexão para o Jeremy Flores. Recordo-me perfeitamente de julgar o Jeremy flores com 12 anos nos pró-juniores europeus, sempre foi um surfista fenomenal, nessa altura chegava às meias-finais com miúdos de 20 anos e não ganhava porque lhe faltava power. A sua carreira tem sido fenomenal, contudo sua postura em termos de comunicação pode ser melhorada, quando questionado pelo Todd kline relativamente à interferência do Bede argumentou que desta vez não tinha sido como em situações anteriores, (Adriano de Sousa em Snapper), onde tinha sido propositadamente forçado a cometer interferência, era desnecessário até porque o que aconteceu agora foi exactamente igual mas estava apenas do outro lado. As regras são para usar e Fair Play fica bem aos grandes campeões.

A remada do Owen para uma onda na final, contra o Julian, na minha opinião, deveria ter existido uma mudança de prioridade, neste tipo de condições críticas foi mais do que um simples “just looking”. O julian não apanhou uma onda que poderia ter feito com que a final fosse pelo menos mais renhida. No entanto apreciei o  Fair Play do Julian, não fazendo qualquer referência ao tema e apenas parabenizando o surf incrível do Owen. É disto que são feitos os grandes campeões.

 


 

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