O Futuro do Surf em Portugal - A Visão de Nuno Gomes, Presidente da ASCC
A Surftotal dá continuidade ao fórum de reflexão sobre o estado atual do surf competitivo e formativo em Portugal com uma entrevista ao presidente da ASCC .....
.... — Associação de Surf da Costa de Caparica — uma das entidades mais ativas na formação de jovens atletas em Portugal. Com um percurso ligado ao desenvolvimento de jovens talentos e à organização de eventos na emblemática Costa de Caparica, Nuno tem acompanhado de perto os desafios enfrentados pelos clubes, treinadores e atletas nacionais. Após ter participado em 2024 e sido pioneiro com a ASCC no Mundial de Clubes de Surf na Austrália, recentemente, a ASCC lançou um comunicado público que alerta para a estagnação do surf competitivo em Portugal e para a necessidade urgente de repensar estratégias e modelos. Nesta entrevista à Surftotal, Nuno Gomes partilha a sua visão sobre o presente e o futuro do surf nacional, apontando caminhos para devolver ambição e sustentabilidade à formação desportiva em Portugal.
Surftotal: A ASCC manifestou recentemente uma preocupação clara com o futuro do surf competitivo em Portugal. O que motivou este comunicado?
O nosso comunicado surge como reflexo de uma observação atenta à realidade dos últimos dois anos. Sentimos que o surf, enquanto desporto competitivo, tem vindo a perder vitalidade e projeção. Não se trata apenas de resultados ou presença nos grandes palcos internacionais, mas de um sentimento geral de estagnação, de falta de rumo e de desmotivação dos clubes, que são a base de tudo.
Surftotal: Mas temos atualmente atletas como o Frederico Morais, a Teresa Bonvalot, a Kika Veselko ou a Yolanda Hopkins a representar Portugal com grande destaque. Como se explica esse contraste?
É verdade, esses atletas são o presente e representam com mérito o surf nacional. Mas todos — ou quase todos — passaram por clubes e eventos promovidos por clubes, como foi o caso da Kika que participou em campeonatos da ASCC. A Teresa não chegou a participar, mas o ponto é que sem clubes não há continuidade. O problema está no que vem a seguir. Se os clubes não tiverem apoio e estrutura, não haverá uma nova geração a seguir-lhes os passos. Valorizar o presente é essencial, mas temos de preparar o futuro.
Surftotal: Que papel estão a desempenhar os clubes neste contexto?
Um papel cada vez mais inglório. São os clubes que formam atletas, mas estão a ser sistematicamente esquecidos. As escolas de surf cresceram muito, mas, muitas vezes, estão mais preocupadas com o lucro imediato do que com a formação desportiva. Defendemos que todas as escolas deveriam estar integradas em clubes federados. Isso criaria uma ponte entre a iniciação e a competição. Mesmo para quem pratica surf sem competir, o orgulho em representar o clube da terra permitiria uma progressão natural e estruturada.
Surftotal: E quanto à organização de campeonatos? Os regionais ainda têm relevância?
É óbvio que têm relevância, mas o problema é que este formato está obsoleto. Há muitas categorias, mas há zonas do país onde não existem atletas para preencher essas categorias, e isso cria desequilíbrios. Achamos que deveria ser repensado. Uma possibilidade seria obrigar os clubes a terem campeonatos intersócios, e que esses campeonatos dessem acesso a uma finalíssima nacional, através de um sistema de qualificação com estrelas ou personas. Isso revitalizaria o circuito e obrigaria os clubes a serem mais ativos, reforçando a base competitiva.
Surftotal: O que espera, então, a ASCC do futuro?
Esperamos uma reflexão profunda por parte das entidades que lideram o surf em Portugal. É urgente valorizar os clubes, rever a estratégia nacional de desenvolvimento competitivo e criar condições para que os jovens atletas portugueses possam sonhar alto. Não queremos apenas ser o campo de treinos da elite internacional. Queremos estar lá, a competir de igual para igual.
Surftotal: Uma última mensagem?
A base do surf competitivo está nos clubes. Se continuarmos a ser ignorados, o surf nacional corre o risco de definhar. O talento existe, e o mar também. Falta vontade e visão estratégica. Estamos prontos para fazer parte da solução e esperamos que nos seja dado o espaço necessário para contribuirmos, cada vez mais, para a mudança.
Esta entrevista integra o Fórum Surftotal: O Futuro do Surf em Portugal, uma iniciativa editorial que pretende reunir vozes influentes do surf nacional — desde clubes e escolas a marcas, atletas, dirigentes, pais e treinadores — para refletir sobre o momento atual da modalidade e os caminhos possíveis para o seu crescimento sustentável. Ao longo das próximas semanas, publicaremos contributos diversos que ajudarão a construir uma visão partilhada sobre os desafios e oportunidades do surf em Portugal.
Se representa uma entidade do surf nacional e gostaria de participar neste fórum, escreva-nos para info@surftotal.com.